Endometriose: a dor invisível que rouba anos de vida às mulheres

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Afetando 10% das mulheres em idade reprodutiva e impactando trabalho, estudos e vida pessoal, esta doença começa a ser reconhecida com medidas legais e acesso a tratamentos

Em Portugal foi aprovada, recentemente, uma nova lei que garante que mulheres com endometriose ou adenomiose terão até três dias de faltas justificadas ao trabalho por mês. Aliás, a medida começa já para jovens na escola, mediante prescrição médica. É um avanço importante, mas que chega depois de décadas em que esta doença foi ignorada, subestimada e tratada como uma “dor normal” da vida feminina.

Por trás desta narrativa, esconde-se uma condição crónica e incapacitante, que afeta cerca de 10% das mulheres em idade reprodutiva e até 45% das mulheres inférteis. No caso da endometriose, trata-se de um tecido semelhante ao revestimento do útero que cresce onde não deveria — nos ovários, na bexiga, nos intestinos, no diafragma ou noutras partes da cavidade pélvica. Este tecido sangra, inflama, provoca aderências e causa dores que são, muitas vezes, insuportáveis.

O diagnóstico que nunca chega

O drama não é apenas a dor, mas o tempo que leva até alguém acreditar nela. A endometriose é frequentemente desvalorizada como “cólicas menstruais fortes”, o que atrasa o diagnóstico e o tratamento adequado. Em Portugal, o tempo médio até ao diagnóstico é entre oito anos e 10 anos — mais de 40% das mulheres esperam mais de uma década. 

Esta desvalorização, tanto a nível social como médico, é um reflexo de uma sociedade que ainda tem dificuldade em reconhecer a dor feminina. Os sintomas, como a dor crónica, o inchaço abdominal e a fadiga extrema, dificultam a concentração, a produtividade e até a simples ida para o trabalho. 

As razões são um espelho de preconceitos e falhas do sistema:

  • Normalização cultural da dor menstrual, minimizada por familiares e profissionais de saúde
  • Falta de formação específica sobre a doença
  • Sintomas que se confundem com outras patologias
  • Dificuldades no acesso a centros especializados

Enquanto isso, 80% das mulheres com endometriose sofrem de dor pélvica intensa; metade enfrenta problemas de infertilidade; muitas vivem com dores durante as relações sexuais, dificuldades urinárias ou intestinais.

Quando a doença trava a vida

A endometriose não ataca apenas o corpo, ela rouba tempo, energia e oportunidades. Na escola, adolescentes perdem aulas, atrasam trabalhos ou abandonam atividades extracurriculares. No trabalho, faltas frequentes e baixa produtividade podem levar muitas mulheres a perder o emprego. E, na vida íntima, a dor e o desgaste emocional afetam relações e a autoestima.

Segundo o PAN (Pessoas–Animais–Natureza), partido político português que tem apresentado diversas propostas ligadas à saúde pública e direitos das mulheres, jovens com sintomas perdem vários dias de escola por mês e, já na idade adulta, podem perder até cerca de 10 horas de produtividade por semana.

Políticas públicas: passos curtos para um problema gigante

Tanto em Portugal como na Europa, tem-se verificado um esforço crescente para melhorar o diagnóstico e tratamento da endometriose.

2020: Em Portugal, uma resolução da Assembleia da República recomendou um diagnóstico precoce, campanhas educativas e comparticipação de tratamentos. Muito pouco foi posto em prática.
2024/2025: Regime de comparticipação de medicamentos para endometriose e adenomiose no SNS, e agora a lei que garante faltas justificadas ao trabalho para mulheres com a doença.

Fora do país, o avanço é desigual. Na Austrália, foi implementado um Plano Nacional de Ação, desde 2018. Em França, houve o reconhecimento como doença crónica e a criação de uma rede de centros especializados, mas apenas em 2021. Já em Inglaterra, a estratégia nacional para a saúde da mulher inclui a endometriose desde 2022.

Políticas empresariais 

Algumas empresas estão já a implementar medidas específicas para apoiar as suas funcionárias com endometriose. Entre elas, está a concessão de licenças remuneradas para tratamento, reconhecendo a necessidade de tempo para consultas, terapias e, em alguns casos, cirurgias. Há também quem opte por oferecer flexibilidade no trabalho, permitindo o regime remoto ou horários ajustáveis, o que ajuda as mulheres a gerirem melhor esta condição e a reduzir o stress diário. Além disso, muitas organizações investem em ações de sensibilização e formação para gestores e equipas, promovendo um ambiente de trabalho mais empático e inclusivo.

A verdade é que a doença continua a ser uma questão invisível para muitos — mas impossível de ignorar para quem vive com ela. Cada ano sem diagnóstico é um ano de dor evitável. E cada política adiada é mais um lembrete de que a saúde das mulheres não pode esperar.

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